1822-2022: NAÇÃO, NACIONALISMOS E MEMÓRIAS EM DISPUTA – DESAFIOS DA HISTÓRIA ESCRITA E ENSINADA
07 de setembro de 2022 – transcorridos duzentos anos de história do Brasil. Nesse intervalo, é possível demarcar uma “linha do tempo”? Se positivo, quais seriam os critérios para preenchê-la? Os anos de 1822, 1840, 1888/1891, 1922, 1930, 1937, 1945, 1964, 1984/1985, 2016, entre outros, já se constituíram como “marcos” de transformações qualitativas nas relações histórico-sociais, expressas em termos sociais, políticos, econômicos e ideológico-culturais. E, como tais, receberam um “antes” e um “depois”, evidenciando as circunstâncias, os processos, bem como os desdobramentos progressivos e regressivos em termos de maior ou menor participação das grandes maiorias sociais nos excedentes e propriedades socialmente gerados, nas decisões políticas, nos serviços públicos e na educação e cultura formal.
Mais do que periodizar, as referidas datas já foram objetos de amplas pesquisas. Independentemente das categorias utilizadas; do lugar da intervenção e papel dos grupos e das classes sociais no curso histórico; das perspectivas de História e da variedade das fontes e dos métodos, a análise/interpretação de cada um destes “fragmentos” de tempo adquiriu espaço na escrita dos/das historiadores/as, delineando assim formas de compreender a História, nos seus vieses de saber histórico e saber histórico escolar.
Compreender a diversidade e multiplicidade de abordagens possíveis que envolvem a dinâmica temporal (a interface entre o passado, o presente e o futuro), eleger critérios de inteligibilidade acerca do objeto histórico investigado e reconstituir o “lugar” dos sujeitos envolvidos e suas ações, não é privilégio exclusivo dos/as historiadores/as. Todavia, a forma como as sociedades lidam com seu passado sempre foi objeto de análise dos historiadores, a exemplo de Eric Hobsbawm, historiador inglês que, em seu texto “O sentido do passado”, afirma que as sociedades se relacionam com seu passado mediante três sentidos. Inicialmente, o passado é “essencialmente padrão para o presente”. Sendo aquele uma seleção prévia do que deve ser lembrado. Nas palavras do autor, “Em toda sociedade a abrangência desse passado depende, naturalmente, das circunstâncias”. (HOBSBAWM, 1998, p. 23) No segundo sentido, o passado já não é mais padrão. Uma vez que houve uma mudança social, o passado pode ser apenas o modelo, “[…] isso implica uma transformação fundamental no próprio passado. Ele agora se torna e deve se tornar, uma máscara para a inovação, pois já não expressa aquilo que ocorreu antes, mas ações que são, por definição, diferentes das anteriores”. (p. 26) No terceiro sentido, dada à impossibilidade de ser reproduzido, ocorre uma rejeição ao passado. Conforme o autor, “nesse momento o passado fica tão distante da realidade atual ou mesmo lembrada que no final pode se transformar em pouco mais que uma linguagem para definir em termos históricos certas aspirações de hoje que não são necessariamente conservadoras”. (p. 27)
A perspectiva trazida pelo historiador inglês demonstra como os sentidos do passado são historicamente construídos, ou seja, as sociedades elaboram compreensões sobre o mesmo, tendo em vista a sua imersão no próprio presente. Especialmente num tempo em que a História Brasileira, com realce para a chamada “História do Tempo Presente”, adquire amplo espaço no âmbito público, no que se referem às monumentalizações dos espaços urbanos, à “captura” ou apropriação específica de símbolos e datas nacionais por vertentes conservadoras e autoritárias, às tentativas de negar os direitos à memória de grupos majoritariamente excluídos, ou ainda, de forma mais nefasta, à negação do caráter violento e excludente materializados nas mais diversas formas de revisionismos ou negacionismos, é fundamental que se tenha a clareza que essas compreensões estão percorridas por disputas que emergem da contradição e conflito social. É certo que dada a possibilidade política da formação histórica e o seu papel no ensino da própria disciplina, os temas históricos adquiriram espaços de disputa para além da academia e da escola. Todavia, nesses espaços devem ser investigados e ensinados sob premissas que são próprias da ciência da história e da educação integrada, respectivamente. Todavia, nesses espaços, devem ser investigados e ensinados sob premissas que são próprias da ciência da História, da interdisciplinaridade e da educação integrada, respectivamente.
É justamente sob esta perspectiva que a IX Semana da Licenciatura em História, com a temática 1822-2022: NAÇÃO, NACIONALISMOS E MEMÓRIAS EM DISPUTA – DESAFIOS DA HISTÓRIA ESCRITA E ENSINADA, propõe reflexões sobre as mais variadas formas pelas quais a articulação entre o passado e o presente tem sido pesquisada, escrita e ensinada. Para além de demarcar a pertinência dos temas e dos debates teóricos e metodológicos, o referido evento propõe, por meio de simpósios temáticos, minicursos e conferências, refletir sobre as apropriações do tempo em termos epistemológicos e políticos.